Investir no exterior já deixou de ser uma opção restrita a grandes investidores e passou a ser uma estratégia acessível para quem busca proteção cambial, maior diversificação e acesso a mercados mais maduros e inovadores. Em um mundo cada vez mais interconectado e com economias fortemente influenciadas por fatores globais, manter todos os recursos alocados apenas no Brasil pode representar um risco elevado à construção de patrimônio no longo prazo.
Nesse contexto, entender como investir no exterior é mais do que uma curiosidade: é uma necessidade estratégica para quem deseja proteger seu capital, acessar oportunidades em setores com maior desenvolvimento tecnológico e estabilidade jurídica e, principalmente, reduzir a exposição ao chamado “risco Brasil”.
Neste artigo, vamos explorar detalhadamente como funciona o investimento internacional, quais são as principais formas de acessar o mercado global, os cuidados regulatórios, fiscais e operacionais, e como essa prática se insere no conceito de diversificação da carteira, fundamental para a construção de uma estratégia de longo prazo sólida e resiliente.
Por que investir no exterior
Antes de entender os caminhos práticos para investir fora do país, é fundamental compreender os benefícios que essa escolha pode trazer ao portfólio do investidor brasileiro. O principal deles, sem dúvida, é a diversificação internacional.
No Brasil, vivemos sob um ambiente de volatilidade política, econômica e cambial. Esses fatores impactam diretamente os ativos domésticos, tanto de renda fixa quanto de renda variável. Ao direcionar parte do capital para ativos internacionais, o investidor reduz a correlação da carteira com os riscos locais e passa a se beneficiar da performance de ativos ligados a economias mais estáveis, como Estados Unidos, Europa e Ásia.
Além disso, investir no exterior também permite:
Exposição cambial positiva: como os ativos são cotados em moedas fortes (como dólar ou euro), eles tendem a valorizar em reais quando há desvalorização do real frente a essas moedas;
Acesso a empresas e setores inovadores: muitas das maiores companhias globais, como Apple, Google, Microsoft, Amazon, Tesla, entre outras, não estão listadas na B3. Para ter participação nesses negócios, é necessário investir diretamente nos mercados em que elas operam;
Estabilidade regulatória e jurídica: mercados como o dos Estados Unidos possuem uma estrutura legal e institucional mais previsível, o que pode trazer maior segurança jurídica para o investidor;
Proteção patrimonial: alocar parte dos recursos no exterior pode ser uma maneira de blindar o capital contra instabilidades domésticas, como crises institucionais, tributárias ou inflacionárias.
O papel da diversificação na estratégia global de investimentos
A diversificação é um dos pilares mais importantes da gestão de riscos em qualquer portfólio. O conceito é simples: não colocar todos os ovos na mesma cesta. Porém, sua aplicação eficaz requer uma compreensão mais profunda da correlação entre ativos, volatilidade de mercados e objetivos de longo prazo.
Investir no exterior amplia significativamente as possibilidades de diversificação, pois adiciona à carteira ativos expostos a outras economias, moedas, políticas monetárias, ciclos econômicos e setores produtivos.
Uma carteira diversificada internacionalmente pode, por exemplo, sofrer menos com uma crise econômica no Brasil, porque parte dos ativos estará em outro ambiente macroeconômico. Da mesma forma, a performance do portfólio tende a ser mais equilibrada ao longo do tempo, pois os ativos podem se comportar de maneira diferente frente aos mesmos estímulos.
Mas é fundamental destacar que diversificar não é simplesmente investir um pouco em tudo. É necessário planejar, entender o perfil de risco, os objetivos financeiros e a correlação entre os ativos.
Como investir no exterior
Atualmente, investidores brasileiros têm diversas formas de acessar o mercado internacional. Algumas delas exigem abertura de conta em corretoras estrangeiras, enquanto outras permitem o acesso via ativos listados na B3. Vamos explorar as principais:
BDRs (Brazilian Depositary Receipts)
Os BDRs são certificados de depósito emitidos no Brasil que representam ações de empresas estrangeiras. Eles são negociados na B3, o que significa que o investidor pode comprá-los diretamente pela sua corretora nacional, da mesma forma como compraria uma ação brasileira.
Essa é uma das formas mais simples de investir no exterior, pois elimina a necessidade de envio de recursos ao exterior, abertura de conta em corretoras internacionais e preocupações com câmbio ou impostos internacionais.
Por outro lado, os BDRs têm algumas limitações. Nem todos representam ações ordinárias (muitas vezes são ações preferenciais), e o número de empresas listadas é restrito. Além disso, o investidor continua exposto ao risco da bolsa brasileira, como liquidez e horário de negociação.
ETFs internacionais listados na B3
Outra alternativa bastante popular são os ETFs (fundos de índice) que replicam a performance de índices globais, como o S&P 500, Nasdaq-100, MSCI China, entre outros. Esses fundos são cotados em reais, mas investem em ativos estrangeiros.
Eles representam uma forma acessível de investir no exterior com diversificação automática e baixo custo, já que cada ETF normalmente reúne dezenas ou centenas de ações em um único produto.
O investidor pode, por exemplo, investir no IVVB11, que replica o índice S&P 500, ou no EURP11, que acompanha o desempenho de ações europeias.
Corretoras internacionais
Para quem deseja ter acesso direto aos mercados estrangeiros, como a bolsa americana (NYSE, Nasdaq), a melhor opção é abrir uma conta em uma corretora internacional.
Existem diversas corretoras que aceitam investidores brasileiros, como Interactive Brokers, Avenue, Passfolio, entre outras.
Abrindo conta em uma dessas plataformas, o investidor pode comprar diretamente ações de empresas americanas, ETFs, REITs (versão americana dos fundos imobiliários), bonds, entre outros ativos.
Apesar de exigir mais atenção com a parte documental, remessas de câmbio e declarações fiscais, esse modelo oferece maior liberdade e exposição direta às economias desenvolvidas.
Estratégias de alocação internacional: quanto investir no exterior?
Ao decidir investir no exterior, uma das dúvidas mais comuns é: qual percentual da carteira alocar fora do país? Não existe uma resposta única, pois essa decisão depende do perfil de risco, horizonte de investimento, liquidez desejada e objetivos pessoais.
Contudo, diversos gestores de patrimônio e planejadores financeiros concordam que entre 10% e 30% do portfólio alocado internacionalmente pode ser um bom ponto de partida para a maioria dos investidores.
Esse percentual tende a ser maior para investidores com maior tolerância ao risco, foco no longo prazo e com a intenção de proteger o patrimônio contra oscilações da economia brasileira.
A forma como esses recursos serão distribuídos também precisa de atenção. Diversificar não significa apenas comprar ações americanas. É possível montar uma estratégia global que inclua:
ETFs globais: para exposição diversificada a economias desenvolvidas e emergentes;
Ações internacionais: empresas líderes em inovação, tecnologia, consumo e saúde;
REITs: fundos imobiliários globais com exposição a imóveis comerciais, residenciais, logísticos, entre outros;
Títulos de renda fixa internacional: bonds de empresas e governos, com diferentes graus de risco e vencimento;
Fundos multimercado globais: que combinam diferentes classes de ativos e estratégias.
Mais importante que buscar retorno imediato é entender o papel estratégico da alocação internacional na carteira: servir como amortecedor de riscos domésticos, oferecer acesso a economias mais maduras e agregar moedas fortes ao portfólio.
Como declarar investimentos no exterior
Investir no exterior também envolve obrigações fiscais que precisam ser cuidadosamente observadas para evitar problemas com a Receita Federal. Ao contrário do que muitos pensam, ter investimentos fora do país é legal e previsto na legislação brasileira, desde que devidamente declarado.
O investidor deve considerar basicamente três obrigações principais:
Declaração de bens e direitos no Imposto de Renda (IRPF)
Todos os ativos mantidos no exterior devem ser informados na ficha de “Bens e Direitos” da declaração de IR, com os valores convertidos para reais pela cotação do dólar no último dia útil do ano anterior.
Apuração de ganho de capital
A venda de ativos estrangeiros com lucro gera ganho de capital, que deve ser apurado mensalmente e, quando houver imposto devido, o pagamento deve ser feito via DARF até o último dia útil do mês seguinte à venda.
Há isenção de IR para vendas mensais que totalizem até R$ 35 mil (regra válida também para ações no exterior).
Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior (DCBE)
Quem possui ativos no exterior que somem mais de US$ 1 milhão em 31 de dezembro deve preencher a DCBE, uma declaração anual ao Banco Central. Se ultrapassar US$ 100 milhões, a obrigação passa a ser trimestral.
Câmbio e remessa internacional de recursos
Para enviar dinheiro ao exterior, é necessário realizar uma operação de câmbio. Felizmente, hoje existem soluções bem práticas, como plataformas digitais de câmbio, bancos e corretoras que oferecem esse serviço com taxas competitivas.
Ao escolher uma instituição, é importante considerar:
Taxas de câmbio (spread): quanto mais próximo da cotação comercial, melhor;
IOF: para envio de recursos para investimento, a alíquota é de 0,38%;
Rapidez e segurança da transferência: prefira instituições autorizadas pelo Banco Central.
A maior parte das corretoras internacionais aceita remessas via TransferWise (Wise), Remessa Online, Western Union e intermediários bancários tradicionais, como Itaú e Banco do Brasil.
Também é possível investir no exterior usando corretoras brasileiras que já realizam a conversão de câmbio internamente (como Avenue e Nomad), oferecendo facilidade para iniciantes.
Tributação no exterior e acordos para evitar a dupla tributação
Uma das preocupações mais recorrentes de quem começa a investir no exterior é o risco de pagar imposto em dobro: uma vez no país onde o ativo está localizado e outra vez no Brasil.
A boa notícia é que o Brasil tem acordos de bitributação com diversos países, incluindo os Estados Unidos, que permitem o crédito do imposto pago no exterior no cálculo do IR devido aqui.
Por exemplo: se o investidor recebeu dividendos de ações americanas e pagou 30% de imposto na fonte, ele poderá abater esse valor do que seria devido à Receita Federal brasileira (observando o limite da alíquota aplicável no Brasil).
É fundamental manter os comprovantes de retenção de impostos no exterior, fornecidos pelas corretoras internacionais, para fins de comprovação na declaração de IR.
Além disso, vale lembrar que:
Nos EUA, dividendos são tributados na fonte, mas ganhos de capital não têm retenção para estrangeiros, o investidor brasileiro deve apurar e pagar o IR diretamente à Receita Federal, conforme as regras brasileiras.
REITs, por sua vez, sofrem retenção maior de imposto nos EUA, o que deve ser considerado na estratégia de alocação.
Conclusão
Investir no exterior já não é mais uma tendência de grandes fortunas, é uma realidade cada vez mais acessível e necessária para quem busca segurança, diversificação e melhores oportunidades para o seu patrimônio no longo prazo.
Num mundo globalizado, em que as fronteiras econômicas são cada vez mais fluidas, proteger o seu capital contra riscos domésticos e acessar empresas líderes globais é uma das decisões mais estratégicas que um investidor pode tomar.
Mas como toda decisão financeira, investir fora do país exige planejamento, conhecimento, atenção fiscal e clareza sobre os objetivos. Começar pequeno, por meio de BDRs ou ETFs internacionais na B3, pode ser um excelente ponto de partida. E à medida que a confiança cresce, abrir uma conta em corretora internacional e montar uma estratégia global pode levar seu portfólio a um novo patamar.
Seja qual for o caminho escolhido, o mais importante é começar com consciência e consistência, entendendo que investir no exterior não é uma aposta, mas uma estratégia sólida para quem pensa no longo prazo.
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